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Com mais de 160 projetos junto a hoteis, AE ajuda sustentabilidade nesse segmento

Arquivo Pessoal
Cresce a cada dia a vontade de parte da população brasileira de aderir e hábitos mais sustentáveis. Mas montar uma casa ou uma empresa de acordo com as boas práticas ambientais ainda é um investimento caro, principalmente em relação ao custo dos equipamentos necessários. Apesar dos valores elevados e, em alguns casos, de tecnologias complexas, os benefícios econômicos e ambientais são relevantes.

O segmento de turismo tem percebido essas vantangens e tem ampliado os investimentos para tornar a sua operação mais limpa e sustentável. O setor de hotéis e pousadas é um exemplo disso, com a adoção de fontes limpas de energia, como a solar fotovoltaica, de técnicas de iluminação e climatização mais eficientes, de processos que utilizam água de reúso, descarte correto de resíduos e com projetos de turismo sustentável comunitário.

Segundo Fábia Trentin, Doutora em Turismo, Lazer e Cultura pela Universidade de Coimbra e professora na Faculdade de Turismo e Hotelaria da Universidade Federal Fluminense (UFF), esse é um processo que está sendo construído ao longo dos anos em diversas redes de hotéis, partindo do princípio de que muito se deve também à conscientização do hóspede para com a localidade que está visitando.

Em entrevista ao Procel Info, ela diz que, apesar de o Brasil ainda não possuir uma grande quantidade de hotéis sustentáveis, essa já é uma tendência observada nos principais roteiros turísticos do exterior. Ela conta que nesses locais a estrutura é completamente sustentável oferecendo opções de entretenimento em equilíbrio com o meio ambiente. A professora também comenta sobre a viabilidade econômica desses empreendimentos, a forma como se comunicam com os hóspedes e o potencial de emprego e renda que o turismo sustentável pode proporcionar.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista com a professora Fábia Trentin. 

Procel Info - Como a senhora analisa o setor de turismo sustentável? É um segmento com potencial de crescimento e com boa aceitação do público?

Fábia Trentin - Vejo o turismo sustentável não como um setor ou segmento, penso que a sustentabilidade no turismo é transversal e extrapola rótulos específicos. Para mim, a incorporação de práticas sustentáveis nos destinos turísticos e também em empreendimentos que prestam serviços turísticos tende a ter boa aceitação do público. Para mim, é um processo que vem sendo construído ao longo dos anos. Como eram as práticas sustentáveis nos empreendimentos turísticos até o início dos anos 1990? A Rio/ECO – 92 influenciou e ainda influencia a introdução de valores e práticas que foram e são incorporados ao cotidiano das pessoas por meio da educação, do processo de sensibilização e conscientização, estímulo e também da adoção de políticas e normas que foram elaboradas e implementadas visando mudar um padrão de desenvolvimento e comportamento econômico e sociocultural. À medida que as pessoas se conscientizam e incorporam hábitos sustentáveis, tendem a se tornar mais exigentes, se preocupando com o ambiente em que estão inseridas. Entretanto, se a informação, educação e conscientização são falhas, é possível que o uso dos termos 'ecológico' e 'sustentável' seja feito de forma oportunista e, muita vezes, equivocada. Se não houver mudança de paradigma na sociedade em relação à sustentabilidade, inclusive no turismo, dificilmente as pessoas conseguirão pensar no destino ou empreendimento turístico como um local para além de atrativos, infraestrutura e entretenimento que atendam às suas necessidades enquanto estiverem lá.
”No mercado encontra-se de tudo! Desde pessoas com preocupação ambiental, até aquelas que utilizam a imagem 'eco' como ação de marketing”

Procel Info – Então, a falta de informação correta acaba sendo uma barreira para o desenvolvimento do setor de turismo sustentável?

Fábia Trentin – A falta de informação diz muita coisa. Ao analisar a questão do turismo sustentável, é preciso saber qual é o seu entedimento de sustentabilidade e de turismo. Em 1998, o professor Paulo dos Santos Pires escreveu um artigo intitulado “Dimensão Social do Ecoturismo”, abordando os agentes interessados no desenvolvimento do ecoturismo como o trade turístico, os agentes do poder público, o turista e a população local,e, em seguida, apresentou alguns conceitos de ecoturismo a partir da concepção dos ambientalistas, dos organismos governamentais, das entidades representativas do trade e dos acadêmicos e consultores. A questão é: qual é o olhar? Penso em uma sustentabilidade no turismo que possivelmente seja utópica, porque extrapola os limites de uma organização, pois tenta captar as interações com o exterior e, nesse caso, muda-se o ponto de referência da sustentabilidade. Não uma organização olhando apenas seu o universo desconectado do meio em que está inserida. Isto é, uma sustentabilidade da organização em interação com o meio e provendo a sustentabilidade além “muros”. E isso pode ser observado nas diversas opções de certificações que contemplam o universo do que é ou seria sustentável. Comparando a ISO 14.001 (Sistema de Gestão Ambiental) à NBR 15.041 (Norma brasileira de certificação para o turismo sustentável), observa-se o quanto a NBR é mais abrangente pois, além da parte ambiental, aborda, por exemplo, questões legais como as trabalhistas, a arquitetura, com princípios sustentáveis, desde material até aproveitamento dos recursos disponíveis como ventilação, luminosidade, harmonia com o meio, apenas para citar alguns. O que seria sustentável em um empreendimento hoteleiro de grande porte e no turismo de base comunitária, por exemplo? Justifica-se pagar mais pelo que é sustentável, ou aceitar e aproveitar instalações mais simples, mas que permitam ter experiências diferentes do cotidiano vivenciando outros modo de vida?

Procel Info – O investimento do setor hoteleiro em sustentabilidade é uma tendência do mercado? Há realmente uma preocupação ambiental quanto a isso ou é apenas uma estratégia de marketing?

Fábia Trentin – Entendo que o investimento do setor hoteleiro em sustentabilidade está vinculado à adoção de tecnologias que serão revertidas em economia e, também, ganho econômico para as organizações. Penso, ainda, que à medida que houver a incorporação de práticas sustentáveis no cotidiano, a sustentabilidade será alcançada aos poucos. Por exemplo: há alguns anos, qual era o custo de se usar lâmpadas de LED, e hoje qual o custo e a relação custo-benefício? Utilizar painéis para geração de energia solar já é viável? No mercado encontra-se de tudo! Pessoas com preocupação ambiental e pessoas que se vinculam ou criam uma imagem “eco”, quando estão mais próximas de um marketing do que de práticas sustentáveis. Nesse caso, penso que a adoção de determinadas medidas pode auxiliar na transformação cultural e comportamental dos empresários e consumidores. Quando visitei a Turquia, observei que as casas populares tinham placas de painel solar para aquecimento de água. Isso é comum em países como a Turquia, Estados Unidos, Japão, Dinamarca, Alemanha entre outros. No Brasil, já se tem algo no programa Minha Casa Minha Vida. Com isso, quero dizer que a política de fomento a projetos turísticos pode condicionar a incorporação de práticas como o uso de tecnologia viável para geração de energia, aproveitamento do lixo para produção de energia, utilização de iluminação eco-eficiente, aproveitamento da luz e ventilação natural, coleta e tratamento do seu esgoto quando a unidade estiver em área rural, são alguns exemplos de boas práticas. E, lembrando, tudo isso deve ser aliado à educação e à conscientização de todos!
”Nos países da Europa é muito comum o uso de painéis solares para aquecimento de água. Essa tendência também já é observada no Brasil”

Procel Info – Em nosso país há muitos hotéis que seguem essa linha? Existe viabilidade econômica para esse tipo de empreendimento?

Fábia Trentin – Há hotéis que seguem essa linha, que são certificados pela ISO 14.001, e outros que também trabalham com responsabilidade social. Há grupos de empreendimentos que criam sua metodologia, como aqueles que são associados ao 
Roteiros de Charme. Há, ainda, a certificação para praias como o programa Blue Flag e muitos outros. A adoção de boas práticas de sustentabilidade, como o uso da certificação, pode ser importante para os empreendimentos que atuam em um nicho de mercado cujo público-alvo considere a sustentabilidade como fator de decisão de compra. Se existe viabilidade econômica? Existe viabilidade econômica e ambiental. Entendo que é uma relação custo-benefício diferenciada a partir do perfil do empreendimento em termos de localização, disponibilidade de recursos econômicos e também naturais como vento, luminosidade, horas de sol, utilização de conceitos da arquitetura sustentável. Isso, pensando em estrutura física. Os estudos de viabilidade econômica e financeira permitem avaliar o quão viável será o empreendimento no curto, médio e longo prazo. O uso de tecnologias pode ajudar a otimizar o uso de determinados recursos como a energia, por exemplo. Em casa, normalmente, uma pessoa gasta 5kWh de energia por dia, mas um turista gasta 35kWh por pernoite. O mesmo ocorre com o uso da água, que passa de 100L/dia para 350L em ocasião de estar hospedado em local fora da residência habitual. Os contextos de viagem e de lazer induzem ao consumo. Qualquer hotel terá ganhos econômicos se investir numa gestão sustentável. Nesse caso, a educação e a mudança cultural poderão contribuir para que os turistas evitem adotar práticas diferentes daquelas que não fazem parte do seu cotidiano, como deixar ar-condicionado ligado quando a energia da unidade habitacional não for ativada pela chave; deixar o chuveiro ligado durante muito tempo; usar as toalhas de modo a trocá-las diariamente, entre outras práticas. Volto a destacar que essa é uma forma de se abordar a sustentabilidade no turismo.

Procel Info – Quais as diferenças entre hotéis sustentáveis do exterior e do Brasil?

Fábia Trentin – Depende. Por exemplo, se nos referimos à certificação e pensamos na ISO ou o Blue Flag, não haverá diferença. Entretanto, se nos referimos à NBR 15.401, é possível destacarmos algumas diferenças. A NBR 15.401 contempla vários contextos que na ISO, por exemplo, são contemplados em normas diferentes. A ISO possui uma norma para a certificação em qualidade, outra para meio ambiente, outra para a responsabilidade social e assim sucessivamente. A NBR contempla conteúdos de qualidade e gestão de processos, questão ambiental e responsabilidade ambiental. Essa diferença ocorre, principalmente, pelas diferenças climáticas dos locais onte elas foram elaboradas. As prioridades variam grandemente entre, por exemplo, eliminar perdas de calor ou permitir o arejamento. Mas, voltando às diferenças, no Brasil existe um maior envolvimento das comunidades locais em alguns projetos de turismo sustentável comunitário. Já na Europa e nos EUA, o foco mantém-se centrado na dimensão ambiental, uma vez que a poluição ambiental é o maior problema. No Brasil e na América do Sul, em geral, assim como na Ásia, África e Oceania, existe uma maior amplitude de despreocupações sociais. Por sua vez, na Europa, há programas de sustentabilidade com orçamento destinado pela própria União Europeia que estimulam as boas práticas não apenas para os empreendimentos, mas para os centros urbanos e indústria, de modo geral. Na Espanha, por exemplo, a Feira Internacional de Turismo (FITUR) trabalha com fóruns de tecnologia e inovação e também sustentabilidade, como a FITUR GREEN, que conta com apresentação de trabalhos acadêmicos e também de interação com os agentes do mercado. No Brasil ainda precisamos ampliar esse tipo de cooperação.
”Qualquer hotel terá ganhos econômicos se investir numa gestão sustentável. Nesse caso, a educação e a mudança cultural poderão contribuir para que os turistas evitem adotar práticas diferentes daquelas que não fazem parte do seu cotidiano”

Procel Info – O setor de turismo e hotelaria sustentável trabalha bem junto aos clientes na adoção de boas práticas ambientais?

Fábia Trentin – É difícil responder essa questão considerando o universo do território brasileiro. Eu, particularmente, não conheço. Vejo, em hotéis, informativos falando basicamente sobre a questão relacionada ao uso racional da água nas torneiras e também das toalhas, além de apelos para a economia de energia elétrica. Para o hóspede, muitas vezes, soa como algo egoísta e lucrativo para a empresa e, muitas vezes, conflita com a posição de consumidor: "Paguei e vou usufruir ou mesmo esbanjar". É mais difícil, mas não impossível, encontrar meios de hospedagem que estejam comprometidos com o desenvolvimento na concepção de Amartya Sen - economista indiano vencedor do Prêmio Nobel de Economia que, entre suas teorias, prega que o desenvolvimento sustentável é uma das estratégias para a superação da pobreza - e que não seja apenas a apresentação de manifestações culturais dos grupos sociais nos meios de hospedagem ou a venda de artesanato. Em Lima, estive em um restaurante que tinha na parede um quadro negro em que informavam que o pescado comercializado era oriundo de uma comunidade de pescadores "X". Mas não havia qualquer convite para conhecermos o projeto, a parceria etc… Mas já vi como interessante a informação, mesmo que incompleta, em minha percepção.

Procel Info – E em relação às oportunidades de emprego? Como é o mercado para o profissional que deseja atuar nessa área e quais os conhecimentos que ele deve ter?

Fábia Trentin – O mercado é competitivo. Vejo que o profissional formado em Turismo e Hotelaria e que tenha um aprofundamento na área pode agregar valor em sua formação e capacitação que lhe diferencie no mercado de trabalho. Se um empreendimento turístico pretende obter alguma certificação, terá que passar por um período de adequação que deverá ser acompanhado por um auditor interno, por exemplo, tendo em vista implementar e acompanhar o processo de ajuste e mudanças no momento da auditoria externa, que irá certificá-lo ou não. Uma vez aprovado, o padrão da certificação deverá ser mantido. Outra opção é a atuação por meio de consultoria. Particularmente, o turismólogo e o hoteleiro são os profissionais que tendem a conhecer melhor o empreendimento, as atividades e os processos. Se tiver uma formação específica e com liberdade de atuação, isto é, uma empresa que realmente queira implementar práticas sustentáveis, terá condições de se posicionar melhor no mercado de trabalho. 


Publicado em 27 de fevereiro de 2018 / procelinfo.com.br


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